Entre as exigências estão a comprovação de que a pessoa terá no Brasil hospedagem, alimentação, transporte, aulas de português e até plano de saúde e odontológico, entre outras. Membro do Talibã ameaça manifestantes em Cabul em protesto no dia 7
Reuters
A Defensoria Pública-Geral da União (DPU) questionou o Ministério das Relações Exteriores do Brasil sobre exigências que considera ilegais para conceder vistos humanitários a afegãos e afegãs que estão tentando deixar o país para fugir do Talibã.
Entre elas estão teste RT-PCR para a detecção de Covid-19 e a comprovação de que a pessoa terá hospedagem, alimentação, transporte e até plano de saúde e odontológico no Brasil e aulas de português, entre outras exigências (veja mais abaixo).
Nenhuma delas estão previstas na portaria interministerial nº 24, de 3 de setembro, que é assinada pelos ministros das Relações Exteriores, Carlos França, e da Justiça e Segurança Pública, Anderson Torres. Ela prevê apenas quatro exigências para o pedido do visto temporário:
Documento de viagem válido;
Formulário de solicitação de visto preenchido;
Comprovante de meio de transporte de entrada no território brasileiro;
Atestado de antecedentes criminais expedido pelo Afeganistão (caso não seja possível, a portaria exige uma declaração de ausência de antecedentes criminais em qualquer país).
A concessão de visto humanitário para afegãos foi antecipada pelo blog da Julia Duailibi. A medida foi articulada pela ministra Maria Elizabeth Guimarães Teixeira Rocha, do Superior Tribunal Militar (STM), para socorrer juízas afegãs (há cerca de 270 no país).
Desde que voltou ao poder, em 15 de agosto, o Talibã está de novo restringido o papel da mulher na sociedade, proibindo-as nas universidades e até de praticar esportes.
Também há diversas denúncias de desrespeito aos direitos humanos e até execuções em praças públicas, como ocorreu entre 1996 e 2001 (veja no vídeo abaixo). O Talibã já proibiu até coisas básicas, como músicas em locais públicos e o corte da barba de homens em barbearias.
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Nesta terça-feira (28), o jornal “Folha de S.Paulo” revelou que embaixadas brasileiras estão fazendo mais exigências do que as definidas na portaria, o que inviabilizaria o visto humanitário a quem está tentando deixar o país.
O g1 entrou em contato com o Itamaraty e, até a última atualização desta reportagem, não havia obtido resposta.
As exigências consideradas ilegais
No site da embaixada do Brasil em Teerã (capital do Irã), uma publicação do dia 22 lista uma série de exigências que não estão previstas na portaria:
“É importante notar que aqueles interessados em pedir o visto humanitário descrito acima deverão comprovar que terão meios para viajar ao Brasil (incluindo emissão de documentos de viagem, pagamento de testes RT-PCR e o próprio bilhete aéreo) e lá se manter (hospedagem, alimentação, transporte na chegada ao país, plano de saúde e dentário, aulas de português, custos relativos a reconhecimento de diplomas, entre outros)”, diz a publicação no site.
“Sugere-se, portanto, contato prévio com instituições no Brasil que estejam oferecendo apoio a cidadãos afegãos afetados pela recente crise política no país”, conclui o texto.
A informação da embaixada brasileira no Irã é mencionada na petição da DPU contra o Itamaraty, assim como um e-mail enviado pela embaixada do Brasil em Ancara (capital da Turquia). A Defensoria também diz que um texto semelhante, que estava no site da embaixada em Islamabad (Paquistão), foi retirado do ar.
A petição traz também um e-mail recebido pela ONG Caritas Arquidiocesana de São Paulo que exigia uma “carta compromisso” da ONG, “que se responsabilizará pelos seguintes itens e despesas”:
“1- No Afeganistão ou em qualquer outro país de trânsito até a chegada ao Brasil: a) hospedagem; b) alimentação; c) transporte desde a fronteira até Islamabad ou do Afeganistão até outro destino intermediário; d) custos de teste RT – PCR, se houver; e) emolumentos necessários para aqueles que não têm passaporte válido; f) auxílio para preenchimento de formulários e serviço de tradução ou intérprete; e g) bilhete de viagem aérea até o Brasil”.
“2- No Brasil: a) custos de teste RT – PCR, para entrada no país; b) recepção no aeroporto de chegada; c) auxílio para registro na Polícia Federal e obtenção de autorização de residência e documentos de identificação; d) renda mensal, condizente ao tamanho do grupo ou família; e) hospedagem; f) alimentação; g) transporte; h) plano de saúde e dentário; i) custos relativos a reconhecimento de diplomas; j) aulas de português; e k) quaisquer outras despesas que venham a ser necessárias durante sua estada no Brasil pelo período de, pelo menos, seis meses”.
Os pedidos da Defensoria
A petição de sexta-feira (24) é assinada pelos defensores públicos federais João Freitas de Castro Chaves, coordenador do grupo de trabalho nacional para migrações, apatridia e refúgio da DPU, e Thales Arcoverde Treiger, defensor regional de direitos humanos do Rio de Janeiro.
A Defensoria Pública-Geral da União exige do Itamaraty informações sobre os fatos apresentados e sobre as exigências não previstas na portaria interministerial, além de questionar se existe alguma instrução do ministério para as embaixadas sobre os requisitos para o visto humanitário a afegãos.
A DPU também recomenda que o governo brasileiro não cobre “plano de saúde e dentário, custeio de revalidação de diplomas ou curso de português, prova de recursos financeiros para hospedagem e alimentação, carta-compromisso ou qualquer forma de patrocínio da acolhida humanitária por organizações não-governamentais” e revogue “quaisquer instruções já transmitidas nesse sentido”.
Os defensores dizem que a petição é uma forma de prevenir uma possível ação judicial e “torna inequívoca a demonstração da ciência da(s) ilicitude(s) apontada(s)”. Eles dão cinco dias úteis para uma resposta do Itamaraty — prazo que se encerra na sexta-feira (1º).
Segundo a DPU, o Ministério das Relações Exteriores não respondeu a petição até o momento.
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Fonte: G1 Mundo